O Processo de Luto

“As pessoas farão de tudo, chegando ao limite do absurdo para evitar enfrentar a sua própria alma. Mas, ninguém se torna iluminado por imaginar figuras de luz, mas sim ao se conscientizar da escuridão” (C. G. Jung)

O Luto é um processo que se inicia após o rompimento de um vínculo e estende-se até o período de sua elaboração – quando o indivíduo enlutado volta-se, novamente, ao mundo externo. O luto é um processo essencial para que nós possamos nos reconstruir, nos reorganizar, diante do rompimento de um vínculo. É um desafio emocional, psíquico e cognitivo com o qual todos nós temos que lidar.  Inclui transformação e ressignificação da relação com o que foi perdido.

Ao contrário do que muitos pensam, o processo de luto pode ocorrer por: Morte de um ser humano, Morte de um animal de estimação, por Separação conjugal, por Aposentadoria, por Demissão do trabalho, por Imigração, por Envelhecimento, por Doença, e por vários outros tipos de rompimento.

Reações à perda de algo significativo, muitas vezes, incluem impedimento e/ou desinteresse temporário na realização das atividades diárias do cotidiano, isolamento social, pensamentos intrusivos e sentimentos de saudade e tristeza, que variam e evoluem ao longo do tempo. Em alguns casos pode culminar num estado de depressão. O traço mais característico no processo de luto são episódios agudos de dor, com muita ansiedade e dor psíquica.

Num processo de luto podemos ou não vivenciar, no meu entendimento após anos de estudo, uma sequência psicoemocional ao longo da nossa reestruturação psíquica, a saber: o Choque/Descrença diante do que foi perdido, Inquietação diante das mudanças ocorridas na vida cotidiana e sobre o futuro desconhecido, Assimilação gradual da perda/ausência e apreensão das perdas secundárias e, por fim, a Compreensão e Integração da ausência que culmina com a Elaboração. A compreensão só se dá a partir de um longo processo e ela não significa esquecer, disfarçar que nada ocorreu ou ainda não sentir dor quando lembrar. Na compreensão o sofrimento psíquico e/ou emocional passa a ser menos intenso, e o indivíduo enlutado passa, geralmente, a restaurar laços sociais, recuperando vínculos antigos e estabelecendo novas relações. Quando a elaboração acontece, morremos para a condição de termos dores e renascemos para a condição de sermos com as dores.

Apesar do luto ser um processo universal, cada indivíduo possui uma forma particular de reagir. Este processo varia de acordo com a faixa etária em que o indivíduo se encontra, o tipo de vinculação existente e as causas e circunstâncias da perda. Varia também de acordo com sua estrutura emocional, vivências e capacidade para lidar com perdas. É fundamental que esse processo de enlutamento seja vivenciado até que ele seja elaborado, para que a dor da perda não fique reprimida. Tal processo se dá de forma lenta e gradual, com duração variável para cada pessoa.

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Quanto à duração do processo, não existe uma resposta conclusiva. O processo de luto é vivenciado pelas pessoas de forma individual e subjetiva, o que torna inadequado estipular um prazo para seu término. Segundo Worden, no entanto, quando se perde uma relação próxima é muito improvável levar menos de um ano e, para muitos casos, pode levar dois anos ou até mais.

Contudo, existem situações em que o processo de luto não segue a evolução normal, ou seja, o indivíduo não consegue se reestruturar, podendo ocorrer fixação numa das etapas e, consequentemente, a não elaboração do luto. Nestas circunstâncias, o luto permanece não resolvido ao longo do tempo, durante vários anos, e, por vezes, para o resto da vida, interferindo no estado emocional da pessoa e impactando significativamente a sua vida. Nestes casos, em que há o prolongamento do luto, o denominamos de Luto Complicado / Prolongado. Este se caracteriza por uma melancolia duradoura, acompanhada em geral de profunda tristeza, problemas de saúde, distúrbios psíquicos e diminuição dos contatos sociais, o que exige processos de readaptação com a ajuda de profissionais habilitados.

A psicoterapia poderá auxiliar o indivíduo no enfrentamento desse processo, na medida em que é um espaço no qual o paciente pode expressar a sua dor, ao mesmo tempo que promove o desenvolvimento de mecanismos internos que permitem superar as fixações ou bloqueios, com vista à compreensão da perda e a um reposicionamento no mundo real. (Parkes, 1998).

Psic. Mestre em Cuidados Paliativos (M.Sc.)
Psic. Especialista em Perdas e Luto
Especialista em Psicologia Hospitalar
Psychotherapist Member of British Psychological Society (GMBPsS)
Blog Perdas e Luto (Instagram)

Livro à VendaAutora do Livro: Legado Digital: Conhecimento, Decisão e Significado – Viver, Morrer e Enlutar na Era Digital

Referências:

Parkes, C.M. Luto: estudos sobre a perda na vida adulta. Tradução: Maria Helena Franco Bromberg. São Paulo: Summus; 1998. 291 p.

Ross, A. Counselling a Practical Guide (London: Icon Books Ltd.); 2013.
Worden, J. Grief Counseling and Grief Therapy. A Handbook for the Mental Health Practitioner (2nd ed.). London: Routledge.; 1991.

“O encontro de Prometeu, Héracles e Quiron – A morte e o morrer: ritos de passagem” (Revista Junguiana v. 29/1, p. 59)

9 comentários sobre “O Processo de Luto

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  3. Olá Nazaré!!! Sou fã do teu site e gostaria de referenciar alguns trabalhos seus, como “O Processo de Luto”, por exemplo. Vocé tem os textos em formato de artigos? Estou fazendo meu tcc da pós, sobre luto e atenta as normas da ABNT, por isso o pedido 😉
    Agradeço tua dedicação e generosidade em dividir teu conhecimento conosco.

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